Eram tempos bem conturbados aqueles.
Bem mais conturbados do que os atuais, acreditem.
Estávamos no interiorzão de São Paulo, na casa de uma das minhas filhas, preparando o Natal, junto com meus netos bem crianças (à época os únicos netos), quando um pequeno "bando" encabeçado pelo pai, chegou no meio da tarde, protegidos por uma ordem judicial, para recambiá-los ao Rio de Janeiro.
Jornada total de mais de 12 horas (talvez 18 horas).
Era 22 ou 23 de dezembro.
No meio do desespero que se formou, prometemos à mãe que ela iria atrás dos filhos no ônibus da noite.
Fomos levá-la ao terminal rodoviário, mais de 10 horas da noite, chorando muito a ausência das crianças e a violência contra elas e qual não foi nossa surpresa ao ver chegar o estranho grupo: os três cercados pelos "seguranças" adultos (um para cada) pegando o mesmo ônibus que a minha filha, mãe deles,
Primeiro para São Paulo (umas 8 horas de viagem) e depois o trajeto São Paulo-Rio de Janeiro (quase outro tanto).
Instruímos a mãe deles para não se aproximar do grupo e nem provocá-los para não causar mais desgaste.
Demos adeus ao ônibus que partia levando esse pedaço de nossa família para longe de nós, limpando nossas lágrimas, quando vimos surgir, no meio de seus "guardiões", um rostinho sorridente na janela do ônibus, e uma vozinha conhecida gritando para nós: "Eu volto."
Era a menor deles, devia ter uns 6 anos e a visão de seu rosto confiante e sua voz firme e sorridente até hoje está intimamente registrada na minha memória afetiva e emotiva.
Todos nós conservamos a "nossa" criança dentro de nós.
Alegre, vivaz, confiante, atenta e ousada.
Muitas vezes nós a aprisionamos num canto escuro da nossa alma, fazemos com que perca a vontade e brilho ou a tornamos fria e cínica como um arremedo de adulto.
Mas ela está lá, tímida, mas pronta, alerta e obediente como a alma de escoteiro.
E quando precisamos dela, de verdade, e a deixamos livre para agir, ela abre a porta do seu cárcere e sorrindo para nós, promete: "Eu volto."
O bom de tudo isso é saber esperar e liberar nossa criança.
Edna de Vasconcelos
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